É Proibido Julagar?
A palavra “julgar” significa proferir uma sentença, decidir como juiz ou árbitro, ou seja, condenar ou absolver alguém. Não creio que essa seja uma prerrogativa humana, à exceção dos magistrados, que são constituídos por Deus para tal.
O Senhor Jesus em Mt 7.1-6, combate exatamente a hipocrisia daquele que tem uma trave no olho mas está preocupado em tirar o cisco do olho alheio. Seria o mesmo que eu apontar o dedo para um irmão acusando-o de pecado, enquanto eu vivo no mesmo pecado que ele. Primeiro, tenho de me livrar do meu pecado (a trave), para depois exortá-lo a arrepender-se do seu (o cisco). De forma alguma Cristo proíbe o julgamento, pois Ele mesmo nos exorta a observar os frutos para se saber a procedência da árvore.
Ao meu ver, o julgamento que ninguém deve fazer é o de se tal irmão é salvo ou não, vai para o céu ou inferno. Isso não nos compete, mas somente a Deus que sonda os corações, e é quem opera a salvação nos eleitos.
Uma pessoa que vive na impiedade pode, pelo poder de Deus, ser resgatada da condenação ainda que tenha cometido pecados hediondos. Posso mesmo me assustar na eternidade com algumas pessoas que julgava condenadas e estarão ao meu lado louvando e glorificando o Senhor.
Temos de entender que o nosso julgamento é falho, exatamente porque somos imperfeitos e pecadores. Contudo, a Escritura nos revela o que é o pecado (pela Lei Moral), e a necessidade de exortar o irmão que está no pecado. Há regras bíblicas claras, inclusive, de como a Igreja deve disciplinar um irmão que está a persistir no pecado, apesar das advertências.
Pedro afirma que o julgamento deve começar pela igreja, e Paulo pergunta aos Coríntios se não havia ninguém sábio entre eles para julgar os problemas entre os irmãos. Portanto Cristo está combatendo verdadeiramente a hipocrisia e não o juízo que o crente deve fazer não somente do mundo, mas também da própria igreja. Devemos zelar pela santidade, pela pureza doutrinária, pela reverência a Deus, ou seja, por todos os princípios bíblicos que nos foram entregues.
Nesse caso, o julgamento não é uma condenação humana, mas a condenação bíblica, pois aos rebeldes ela revelará o seu pecado e a sua punição.
De qualquer forma é um assunto complexo, porém, reafirmo o que disse: Em Mt 7.1-6, Cristo combate a hipocrisia, e o julgamento como uma sentença condenatória acerca da salvação (se fulano é salvo ou não). Quanto ao caminhar na fé dada uma vez aos santos, todos os santos não somente devem mas têm o dever de zelar pela pureza da igreja, conforme o alerta do Senhor: “E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano” (Mt 18.17); e de Paulo: “Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais. Porque, que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que estão dentro? Mas Deus julga os que estão de fora. Tirai pois dentre vós a esse iníquo” (1Co 5.11-13). [1]
Como se vê, o julgamento é preciso, mas à luz da Escritura e não da nossa mente caída. Por isso a santificação é fundamental, pois, sem ela, agiremos carnalmente, como inquisitores, e não em amor tanto para com Deus, para com a Igreja, como para com o próximo. O objetivo nunca deve ser o de condenar, mas o de ser instrumento de Deus para trazer o pecador à santidade; mas isto não nos exime de aplicar os princípios bíblicos da correção (como consequência do juízo bíblico), a fim de não se contaminar o Corpo de Cristo.
Outro ponto importante é, Cristo, ao dizer que “com o juízo que julgares sereis julgado”, alerta-nos de que, julgando hipocritamente o próximo, além de estarmos em pecado (não pelo julgamento em si, mas pelo julgamento hipócrita, ou seja, por estar em pecado, fazer vistas grossas a ele e apontar o dedo para o irmão), seremos julgados pelo pecado da hipocrisia. Ao meu ver, o alerta do Senhor está evidenciado pela sentença: “com a medida que medires sereis medido”.
A hipocrisia, entre outras coisas, visa tirar o foco de nós e transferi-lo a outro, com o nítido objetivo de esconder nossos pecados através da revelação dos pecados alheios. Logo, além de tudo, há uma evidenciada intenção de não arrependimento e não regeneração no hipócrita. Ele quer que todos os olhares se voltarem para o alvo do seu julgamento, e aos olhos humanos ele se revista de uma santidade que não possui, pelo contrário, sua alma se delicia na vergonhosa pecaminosidade. Por isso, o Senhor Jesus condenou tão peremptoriamente os fariseus, sacerdotes e escribas por suas atitudes hipócritas.
Em Mt 23, Ele proclama em alto e bom som suas atitudes e o seu destino final. Há pessoas que veem na proclamação do Senhor uma atitude de amor. Mas não consigo vê-lo amando aqueles que tão veementemente chama de “raças de víboras”, “sepulcros caiados”, “condutores de cegos”, “hipócritas”, “assassinos” (“a uns deles matareis e crucificareis; e a outros deles açoitareis nas vossas sinagogas e os perseguireis de cidade em cidade”). Senão, qual a razão de proferir: “serpentes, raça de víboras! como escapareis da condenação do inferno?” (v. 33).
Para mim, Cristo está proferindo um julgamento contra os fariseus e escribas. Não vejo de outra forma.
Notas:
[1] Não é interessante Paulo falar à igreja de Corinto para tirar o iníquo de dentro dela? Por que? Para que seja julgado por Deus, pois é ele quem julga os que estão fora da igreja; mas, na igreja, o Corpo é que tem a prerrogativa e autoridade para fazê-lo, não nos deixando eximir da responsabilidade dada. Ao se retirar um ímpio da igreja, ele perde a proteção eclesiástica e, portanto, será julgado por Deus; pois a igreja não será julgada, posto Cristo ter morrido por ela, e limpado-a de todos os seus pecados.
Pense nisto.
Jorge Fernandes
Jorge Fernandes
Nenhum comentário:
Postar um comentário