2015/04/13

Recuperando o Tesouro Perdido do Culto Vespertino » Jon Payne

Certa vez, ouvi falar de uma mulher Cristã idosa que tinha dificuldades de locomoção devido à artrite crônica. Apesar da sua condição, ela fielmente comparecia aos cultos matutino e vespertino todo Dia do Senhor. Quando perguntada sobre como ela sempre conseguia participar dos dois cultos, ela respondeu da seguinte forma: “Meu coração chega lá primeiro, e minhas pernas apenas o seguem”.

Infelizmente, nos dias atuais, a atitude do coração desta amável senhora é quase tão rara quanto o próprio culto vespertino. Na verdade, nos últimos vinte anos, o culto vespertino em uma variedade de tradições Cristãs ou foi transformado em um tipo de comunhão informal (com a participação de cerca de 10 a 15% da congregação), ou foi aniquilado completamente.(1) Mesmo dentro das fileiras Reformadas – onde o culto vespertino tem sido historicamente visto como uma parte inegociável da observância do Dia do Senhor e da edificação congregacional – o culto vespertino está cada vez mais sendo abandonado. Mas, por quê? Porventura, nós somos mais maduros do que os nossos antepassados Reformados e temos menos necessidade da ministração da Palavra, dos sacramentos e da oração? Acho que não. Uma melhor resposta pode ser que, em geral, a igreja se tornou mais imatura, mais distraída e mais ocupada com conforto terreno, entretenimento e lazer. Para resumir, nossos valores mudaram.

Eu não cresci frequentando o culto vespertino no Dia do Senhor, e as igrejas que eu frequentei não o ofereciam. Eu consigo lembrar claramente a rotina dominical da minha família: frequentávamos o culto matutino e então gastávamos o restante do dia no campo de futebol, assistindo televisão ou fazendo tarefas domésticas ao redor da casa. Do ponto de vista prático, o “Dia do Senhor” era apenas a “hora do Senhor” ou, na melhor das hipóteses, a “manhã do Senhor”. Como muitos evangélicos de hoje, eu não lembro que a minha família tenha sido alguma vez ensinada ou encorajada a agir de forma diferente. Depois de quase vinte anos na fé Reformada, no entanto, agora creio que o culto vespertino é uma parte vital da edificação espiritual, crescimento e discipulado Cristãos. Minha esperança é convencê-lo do mesmo. A seguir, são mostradas cinco razões pelas quais os Cristãos deveriam alegrar-se em comparecer ao culto matutino e vespertino, no Dia do Senhor.

1. O culto vespertino finaliza o Dia do Senhor com adoração

O Dia Sabático [Sabbath] foi instituído por Deus na Criação (Gênesis 2:3), republicado por Deus no Decálogo (Êxodo 20:8), e reafirmado por Cristo – o Senhor do Sabbath – nos Evangelhos (Marcos 12:8; Marcos 2:28). Em conjunto com o trabalho e o casamento, o Dia Sabático [Sabbath] constitui uma parte da própria ordem da Criação. Embora seja verdade que as extensões da lei cerimonial e civil do Sabbath foram anuladas em Cristo, o aspecto moral permanece vigente. Portanto, os filhos de Deus ainda são ordenados a santificar o Sabbath da Nova Aliança, ou o Dia do Senhor, e mantê-lo santo.
O Dia do Senhor foi planejado para ser uma bênção espiritual para a igreja, não um fardo. Se ele é um fardo, devemos perguntar a nós mesmos por quê. Por que é tão oneroso finalizar o Dia do Senhor com o culto vespertino? O Sabbath foi planejado para ser um dia inteiro de deleite no Deus Triúno e de celebração das suas obras de criação e redenção. Os membros fiéis que participam tanto do culto matutino quanto do vespertino finalizam este dia especial com uma adoração teocêntrica e nos ajuda a não transformar o resto do Dia do Senhor em algo que Deus nunca intencionou. O culto vespertino preserva o Dia do Senhor para não se tornar apenas igual a outro dia da semana.

2. O culto vespertino segue um padrão bíblico de adoração

O título dado para o Salmo 92 é “Cântico para o dia de Sábado”. O salmista começa exclamando “Bom é render graças ao SENHOR e cantar louvores ao teu nome, ó Altíssimo, anunciar de manhã a tua misericórdia e, durante as noites, a tua fidelidade” (Salmos 92:1-2). Esta ênfase no culto matutino e vespertino também está destacada na administração dos sacrifícios matinais e vespertinos da antiga aliança (Números 28:1-10). O Dia Sabático [Sabbath] é para ser uma “santa convocação” ou um santo ajuntamento do povo de Deus para o propósito de adoração corporativa (Levíticos 23:3). Embora o Novo Testamento não ordene explicitamente o culto matutino e vespertino no Dia do Senhor, nós podemos encontrar provas de que o povo de Deus se ajuntava à noite para adoração no primeiro dia da semana (Atos 20:7).

3. O culto vespertino constitui uma parte da tradição reformada

Até décadas recentes, o segundo culto (vespertino) era uma parte essencial da observância do Dia do Senhor para crentes Reformados. Em seu livro, Recuperando a Confissão Reformada (“Recovering the Reformed Confession”), R. Scott Clark nos lembra que “a prática Reformada clássica era manter dois cultos no Dia do Senhor. Em anos recentes, contudo, o segundo culto tem passado por tempos difíceis. Se tornou mais difícil encontrar um segundo culto. Julgando-se por evidências empíricas, um número significativo de congregações Reformadas tem eliminado o segundo culto”.
O segundo culto foi estabelecido nos estágios iniciais (década de 1520) da Reforma Protestante. Ele foi implementado para que as congregações pudessem receber mais da Palavra de Deus. Nas manifestações mais fiéis da fé Reformada histórica, a pregação da Palavra e a correta administração dos sacramentos foram altamente estimadas. A implementação de não apenas um, mas dois (ou, às vezes, até três) cultos públicos no Dia do Senhor reforça a crença no poder, eficácia e suficiência dos meios ordinários de graça para salvar, santificar e confortar o eleito de Deus. No dia santo que Deus separou para o santo louvor e para edificar a sua igreja, por que não desejarmos mais – ao invés de menos – pregação, cântico de salmos e hinos, oração, participação nos sacramentos, culto e comunhão corporativos? Talvez, a tendência de marginalizar (ou cancelar) o culto vespertino nos círculos Reformados nos dias de hoje, exponha nossa frouxidão em relação à tradição Reformada. Também pode revelar algo sobre nossa condição espiritual.

4. O culto vespertino é um chamado divino e providencial para adoração

Minhas três palavras favoritas depois do culto matutino dominical são: “Até a noite”. Comparado com o culto matutino, o culto vespertino (se agendado) tem, frequentemente, uma pobre frequência. Na verdade, na maioria das igrejas, é comum um número menor do que 25% da congregação retornar para o culto vespertino. Este abandono do ajuntamento vespertino, contudo, pode ser sanado com uma correta compreensão do chamado de Deus e sua providência. No chamado litúrgico para a adoração, através do seu servo ordenado e pela sua Palavra viva, Deus chama seu povo da aliança para se ajuntar na adoração pública. Em alguns casos, o chamado para adoração ocorre tanto pela manhã, quanto à noite. A Confissão de Fé de Westminster exorta os crentes a nunca negligenciarem “descuidada ou voluntariamente” o culto público, “sempre que Deus, pela sua providência, proporciona ocasião” (CFW XXI, vi; cf. Hebreus 10:25). Vale a pena ressaltar os dois chamados que são mencionados: o chamado de Deus por sua Palavra, e o chamado da providência pelos presbíteros. Como os presbíteros, na providência de Deus, têm definido as oportunidades para o culto público e como, nestas ocasiões designadas, Deus, por Si mesmo, chama a congregação para a adoração, os Cristãos, portanto, devem fazer todo o esforço para atender fielmente a ambos os cultos (matutino e vespertino). Resumindo, a menos que alguém seja dificultado pela distância ou pela saúde debilitada, abandonar o culto público no Dia do Senhor é, em certo sentido, equivalente a abandonar o chamado de Deus para a adoração e a liderança espiritual dos presbíteros (Hebreus 13:17). Participar tanto no culto matutino, quanto no vespertino, não demonstra apenas uma fome pelos meios de graça ordenados por Deus, mas também mostra uma vontade de levar a sério os votos de membresia que cada um fez.

5. O culto vespertino: uma porção dobrada

Questão: Como Deus, de forma mais densa e eficaz, comunica Cristo e seus benefícios salvíficos ao eleito? Resposta: Através da proclamação fiel da sua Palavra e do correto uso dos sacramentos (João 6:54; Romanos 10:17; 1 Coríntios 1:21; 1 Pedro 3:21). Novamente, nossa confissão Reformada afirma o seguinte:

“Quais são os meios exteriores pelos quais Cristo nos comunica os benefícios de sua mediação? Os meios exteriores e ordinários, pelos quais Cristo comunica à sua Igreja os benefícios de sua mediação, são todas as suas ordenanças, especialmente a Palavra, os Sacramentos e a Oração; todas essas ordenanças se tornam eficazes aos eleitos em sua salvação” (Catecismo Maior de Westminster, Q. 154).

Ao participar dos cultos matutino e vespertino no Dia do Senhor, nossas famílias recebem uma porção dobrada dos meios de graça. De fato, quando nos colocamos no caminho dos meios de graça ordenados por Deus, em ambos os cultos matutino e vespertino, anualmente iremos cultuar a Deus e receber suas preciosas promessas cento e quatro vezes, ao invés de cinquenta e duas. Nós escutaremos um adicional de cinquenta e duas exposições de sermões cuidadosamente preparados, participaremos da Ceia do Senhor duas vezes mais (se ela ocorrer semanalmente, alternando os cultos a cada Dia do Senhor), cantaremos centenas de salmos e hinos a mais, e oraremos uma miríade a mais de orações. Novamente, não foi exatamente por isso que a tradição Reformada – com sua visão elevada de Deus e dos meios de graça – historicamente implementou e considerou inegociável o culto vespertino no Dia do Senhor?

Caríssimo crente Cristão, nós apenas tocamos de leve neste tópico tão importante. Mesmo assim, talvez estas 5 razões pelas quais devamos participar do culto vespertino no Dia do Senhor irão fazer você reavaliar sua prática atual – talvez seja a oportunidade de considerar a implementação do culto vespertino na sua congregação. Quem sabe, pela graça de Deus, quando estivermos idosos e com artrite, sejamos capazes de dizer, em conjunto com aquela amável senhora: “Meu coração chega lá primeiro, e minhas pernas apenas o seguem”.

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