Pouco pode ser dito, nesse assunto, além do que disse Joseph Alleine, um dos puritanos do século XVII:
“Não existe prova maior de que não somos convertidos,do que ter pelas coisas do mundo estima, amor e desejo.Não há acordo entre o salvo e o mundo.”
Se formos convertidos por Deus, nosso alvo é Cristo, mas se nos convertemos, o nosso objetivo é ter uma boa impressão perante os nossos observadores. O que motiva um convertido é Cristo, o que estimula aquele que se converte é sua performance perante a opinião do mundo. O convertido vive de Cristo e o convencido, da aprovação do mundo.
Quando somos convertidos, pelo Espírito Santo, ganhamos uma nova natureza que se nutre da vontade do Altíssimo. O que interessa à nova criatura é ser conformado à vontade Divina. O que motiva ao intrometido é a sua imagem e sua dignidade pessoal.
Os religiosos gostam de se exibir. Eles querem ser vistos a todo custo, mesmo que isso os levem ao ridículo. Jesus disse que a vida que estimula a fé é fora de holofotes ou em particular. Por que será que tem tanta gente que prefere tocar trombeta nas ruas, soltar foguetes nas praças e alardear a sua crença para tornar notórios os seus projetos?
A fé cristã nunca é propagandeada; é só proclamada de coração a coração. Se pregamos o evangelho, o resultado são vidas alcançadas e nunca a exibição de nossos feitos. Quem ora, ora à porta fechada. Quem jejua, o faz com um rosto de festa. Quem dá esmolas não dá relatório do que deu. A evidência do evangelho é a glória de Deus.
O espírito da cruz tem como fundamento manter o cristão fora do palco. Pois, a vida cristã é a vida que vem da cruz. E o que aconteceu com a igreja atual? Vive no palco, vivendo de shows. Horatius Bonar, em razão da ausência da cruz na vida da igreja, disse: “procurei a igreja e encontrei-a no mundo; procurei o mundo e encontrei-o na igreja”.
Essa mistura de mérito com graça tornou a igreja sem testemunho. Se a igreja vive no mundo, é natural, mas, se o mundo estiver vivendo na igreja é uma aberração. E, significa, que a turma sem conversão tomou lugar no meio da igreja e implantou o modo de pensar do mundo no seio da igreja. Nesse caso a igreja se torna sal insosso.
O mérito está para a graça, assim como as drogas estão para a vida sóbria. É impossível você encontrar um bêbado-sóbrio, ao mesmo tempo. É inimaginável ver uma pessoa governada pelos méritos, dependendo da suficiência da graça. Não existe!!!
Mendigos, é aqui que vemos quem é salvo ou não. Se alguém carece exibir as suas obras, então a graça é dispensável. Anotou?
espírito da cruz 16 – a lei da fé
“Quem vê cara não vê coração”, já diz um velho ditado. No mundão da religião a coisa que tem mais valor é a aparência. Para muitos, atos visíveis são mais atraentes e aceitáveis do que as atitudes subjetivas. Mais vale uma conduta aparentemente exemplar do que as intenções que não podem ser mensuradas pelos nossos sentidos.
Entretanto, as atitudes são os melhores indicadores de como os nossos atos são feitos. Nesse caso, só Deus pode saber o que encontra-se no íntimo do coração.
O que está em jogo na esteira religiosa é um bom comportamento. Mas a fé, no cristianismo, não é essencialmente o programador da conduta, mas, o poder explosivo da nova vida que se manifesta no caráter, e, não, necessariamente, na reputação.
Saulo era um modelo moral dos legalistas. Sua vida, como judeu religioso, era inatacável, enquanto, Paulo, como cristão, sofria a perseguição dos religiosos por ser um homem livre das exigências comportamentais de sua antiga crença farisaica. Acredito que a conduta seja fundamental, se forem legítimas as atitudes.
Precisamos, antes de tudo saber, que um bom comportamento, sem uma boa atitude, não vale nada para a fé cristã. O cristianismo não é uma forja de formar legalista, como também não é “um deixa como está, para vê como é que fica” do antinominalismo.
A lei da fé não é um código; é uma pessoa. Não são normas que normalmente aprendemos para praticá-las, pelo condicionamento; é Cristo vivendo no cristão, depois deste ter morrido e ressuscitado com Cristo. Por isso, essa vida, não carece de exibição na passarela, uma vez que é a manifestação interior da vida de Cristo que se exterioriza de modo tão natural, como os frutos de uma planta, na estação próprio.
O espírito da cruz tem a ver com esse estilo. Jesus mostrou, por exemplo, que a pessoa que jejua não propala sua façanha. A abstinência de alimentos aponta para uma realidade espiritual que não deve ser demonstrada ao público, além do que, o carro chefe do jejum é a oração, que também deve manter-se em oculto, como um culto à Deus.
Quando digo que é a oração que puxa o jejum, quero dizer que é a comunhão com Deus que nos priva de comer. Estamos tão envolvidos nesse relacionamento, que a comida foi suprimida. Mas tudo isso governado pelo espírito da cruz que não precisa dos holofotes para se expor. Oração e jejum andam juntas, nessa ordem, sem necessidade de uma vitrine para exibirmos nossos talentos ou os êxitos em nossa história.
Embora, Mendigos, a vida com Deus deva ser bem particular, seu efeito chega a outros, não como exibição, mas como influência. Olhem C. H. Spurgeon: A beleza serena e silenciosa de uma vida santa é a influência mais poderosa do mundo, depois do poder do Espírito de Deus.
espírito da cruz 15 – humilde com orgulho
Alguém disse: “engolir o orgulho raramente produz indigestão,” mas, às vezes, dá azia. Humildade fingida é como fogo na tela, é só imagem. Quero confessar: na minha história, há mais cara de humilde do que a coroa da sinceridade. Se alguém me desse um título de gente humilde, vou achar graça, embora, meu coração vá gritar: impostor!
Será que J. Blanchard está certo ao afirmar: “Deus pensa mais no homem que pensa menos em si.” Acho que precisamos analisar isso. Não creio que Deus pense como nós pensamos, nem que Ele avalie como nós avaliamos. Pensar menos em si pode ser o sinal de + para quem quer contabilizar a virtude, pois aquele que a tem, não poder saber que a tem, uma vez que, se souber, deixará de tê-la. Humildade não sobe em palco.
Segundo Agostinho de Hipona, a humildade é uma qualidade que aquele que a exibe, não tem nem noção que a tem, porque, se souber, vai se orgulhar dela, torna-a, de fato, inútil. A humildade nunca se reconhece, vendo-se num espelho.
“Penso que a evidência principal da diferença entre a certeza verdadeira e uma falsa, baseia-se no fato de que a verdadeira produz humildade.” A questão é: a humildade nunca se percebe humilde. Ninguém, que for humilde de verdade, se enxergará como tal.
A única pessoa que foi humilde de verdade foi Jesus, porque Ele nunca firmou-se em si mesmo. Ele disse:Eu nada faço por mim mesmo. Eu só faço o que meu Pai faz, ou, eu faço o que meu Pai faz em mim e através de mim. Jesus viveu aqui 100% pela fé em Seu Pai. Isto é o verdadeiro espírito da cruz. Ele viveu em total dependência do Pai.
Humildade propagandeada, ainda que disfarçada de altruísmo, é embuste e um meio sutil de chamar a atenção para os méritos da dissimulação que vende, por baixo dos panos, o seu orgulho como se fosse o maior desprendimento. É a carência de significado incondicional do amor furioso de Abba que promove esse jogo ardiloso onde a altivez vem vestida com trajes rotos de humildade aparente.
Pede-me um sinal de humildade e eu te direi: um morto. Quem morreu não age com soberba, nem reage com falsidade. Jesus viveu sob os efeitos da cruz eterna, e veio para nos fazer morrer juntamente com Ele, a fim de nos fazer livres de nós mesmos. Se já morremos com Cristo, somos libertos da tirania de nosso ego altivo e camuflado.
“Da mesma forma como os rios fluem por vales e regiões mais baixas, também a raiz de todos os atos santos é nutrida pela humildade,” descendo, mas sem alarde. Não existe um tipo de humildade com glamour. O espírito da cruz jamais se exibe.
Vamos em frente neste ponto, mendigos da graça! Como dizia São Crisóstomo, “a humildade é a raiz, a mãe, a ama-de-leite, o alicerce e o vínculo de todas as virtudes,” embora com total e verdadeira discrição.
espírito da cruz 14 – fé ostentação
Temos procurado analisar aqui o espírito da cruz, como o estilo cristão de vida. O que caracteriza a fé que uma pessoa tem em Cristo é a maneira efetiva como ela vive sob os efeitos da crucificação do ego com Cristo. Não mais eu, mas Cristo vive em mim.
Todos, na igreja, querem ser beneficiados com o poder da vida ressurrecta de Cristo, embora, poucos queiram receber os estigmas da cruz, em seu modo de ser. Mas, a vida que nasce da tumba, não se expressa, sem que a cruz extermine o velho Adão. É aqui que reside toda a eficácia do Evangelho: – não ser um exibido do seu cristianismo.
A fé alardeada é ostentação da crença. Ninguém pode viver sadiamente a vida cristã sob as luzes dos holofotes e os aplausos da plateia. Nada de espetáculo ou show. Tudo é discreto, nos bastidores, fora dos olhares curiosos e sem notoriedade.
Mesmo as atividades públicas, como a pregação, precisam contar com um sutil sequestro do pregador, realizado pelo Espírito Santo. Ainda que os pregadores estejam à frente da congregação, eles necessitam estar escondidos com Cristo em Deus. Todos os que foram chamados por Deus para o Seu ministério têm que sair de cena, para que só o Senhor seja totalmente visto através desses Seus instrumentos.
Cristianismo é Cristo vivendo no cristão. Não se trata de: “em seus passos que faria Jesus”, mas da internalização da vida de Cristo naquele que já tenha sido crucificada com Cristo. Mas, tudo isto, é feito por Deus, de modo subjetivo, no íntimo dos Seus filhos.
Uma dessas realidades espirituais, fora do palco, é a vida de oração. Jesus foi explícito quando disse:quando você for orar, entra no seu quarto, fecha a porta e ora ao seu Pai que está em secreto e seu Pai, que vê em secreto vai lhe escutar e recompensar. Fica claro que a oração é, antes de tudo, intimidade com Deus, sem testemunhas.
Aqueles que têm vida de comunhão com a Trindade, não têm a necessidade de expor o seu relacionamento íntimo para receber aprovação de terceiros. Nessa cabine de oração particular não cabe espiões ou vigias, nem mesmo se deve contar, para os outros, aquilo que foi comunicado como os segredos do coração penitente.
Os verdadeiros intercessores nunca publicam os seus hábitos de oração, muito menos, fazem striptease da sua intimidade para chamar a atenção. O espírito da cruz tem como princípio manter os crentes em Cristo cobertos pela vida de Cristo, enquanto levam o morrer de Jesus em seu estilo de viver. Não há exibição na vida de oração.
Mendiguinhos, se quisermos aprender a orar, tendo o espírito da cruz como um legitimador da nossa fé, nada pode ser mais importante do que o ostracismo. É só sair do foco das lentes da câmera e entremos na câmara do refúgio secreto com o Altíssimo. Não será possível uma vida de oração propagandeada.
espírito da cruz 13 – pomba ou pompa
Jesus fincou dois marcos como distintivos do ministério de seus discípulos: são simplicidade e prudência. Ele disse: sejam simples como as pombas e prudentes como as serpentes. A vida do cristão deve ser simplesmente uma simples representação visível da simplicidade de Cristo. Isso significa que não há complexidade no modo do cristão viver.
Tenho em minha casa um bando de pombas que tenta fazer os seus ninhos em lugares dos mais inconvenientes, para o bem estar da família. Mas, se alguém desmontar o ninho, é um trabalho incansável – elas vêm e fazem de novo. As pombas são simples ao máximo e nunca se ofendem. Estão lá fazendo as mesmas coisas o tempo todo.
Faça desta regra simples uma diretriz para sua vida: não ter nenhuma vontade que não seja a simples vontade de Deus. O que mais precisamos é simplesmente render a nossa vontade complexa à simplicidade da graça de Deus. Aqui é ser como as pombas.
O pecado nos tornou em seres complicados, que nunca se contentam e jamais se rendem, se não chegarem ao fim de suas forças. O fim de nós mesmos pode ser a era da simplicidade. Nós só descansamos quando saímos do palco e deixamos o governo da nossa vida nas mãos de quem pode dar sentido ao vôo das borboletas.
As lagartas são vorazes e destruidoras, mas, por uma razão que a biologia não explica, elas morrem para vida que rasteja, a fim de voarem alto como borboletas. No fim, a história tipifica a obra da cruz. O ser humano complexo e destruidor precisa morrer para si mesmo e ressuscitar com a vida de Cristo. Com razão, M. Lutero estava certo ao dizer que, saindo de cena: o simples ordenhar de vacas pode ser feito para a glória de Deus.
A simplicidade é o estilo de vida de quem é de cima. É a encarnação da vida de Cristo em quem tenha sido crucificado com Cristo. Se a pomba fala duma gente simples, a pompa, só fala de gente que se orgulha dos seus méritos terrenos, contrapondo-se aos dons da graça. A maioria de nós tem uma necessidade enorme de holofotes ou vitrines.
A singeleza de coração é um reflexo do espírito da cruz agindo nas entranhas e na mente dos filhos de Abba. Uma alma orgulhosa não se satisfaz com coisa alguma, mas a alma simples faz festa com algodão doce, já que é uma alma de criança.
Entretanto, Jesus abordou, também, a prudência das serpentes. Não se vê por aí serpentes transitando sem motivos específicos. Elas só saem quando vão alimentar-se ou cruzar. Só atacam para pegar a presa e quando estiverem ameaçadas. É prudente, no mínimo, ser prudente como as cobras, que nunca atacam quem não lhes intimidam.
A defesa do santo nunca deve estar ligada aos interesses pessoais, ainda que, muitas vezes, até poderia. O crente só faz apologia da fé. Atenção mendigos, se vocês já foram justificados, nunca se justifiquem, ok?
espírito da cruz 12 – papo furado ou fato apurado
Viver como zero num mundo em que a ambição é ser como dez, constitui-se no milagre sem explicação. O pecado tem como proposta tornar-nos, cada um de nós, como Deus. Logo, viver sem qualquer expectativa de importância, sem levar-nos a nós mesmos a sério, é algo fora de série, extraordinário, espantoso, miraculoso.
A anarquia caótica é exatamente a universalização dos absolutos. Você tem a mínima ideia do que seria esse planeta cheios de deuses soberanamente absolutos? É, exatamente isso, que o individualismo teomaníaco pretende estabelecer na terra.
É absolutamente impossível vivermos neste mundo sem uma pitada, por menor que seja, de altivez. Não conheço um bebê, que já tenha alguma mobilidade, que não se aproprie dos seus direitos de notoriedade, buscando algum grau de exaltação. É, por isso, que fica sem chance alguém se desestimar, quando a autoestima é o padrão natural.
Alguém estava comentado que certa pessoa tinha uma baixa auto estima. Para mim, isso é apenas o uso estratégico de se chamar a atenção de uma forma sutil. Não vi, ainda, um ser com baixa estima. O que vejo são soberbos se rastejando para consegui as suas migalhas de aceitação, usando esse expediente baixo. É cobra, cobrando o direito.
A única maneira de retirar o ser humano da passarela é matando. Calma! Não estou falando de assassinato. A morte aqui é compartilhada com Cristo. É a morte do réu, pecador, na mesma cruz com Cristo. É substituição da vida adâmica pela vida que nasce da tumba. É não mais o eu, mas Cristo vivendo em mim. Mas, é pena de morte pra todos.
Contudo, isto não pode ser apenas uma doutrina. Não se trata de um conceito teológico ou uma idealização psicológica. Muitos de nós até pregam a mensagem da cruz, mas parece que não fomos pregados na cruz. Falamos bem convictos da co-crucificação e parecemos muito sinceros quando falamos, embora vivamos como se nada disso fosse verdade. Não se vê o espírito da cruz esculpido no nosso modo de viver.
Ter a mensagem correta da cruz é imperioso na pregação do evangelho, porém isso na basta. O que caracteriza a autenticidade da mensagem é o espírito na cruz agindo no modo de viver do crente. Alguém me disse, eu não creio naquele sujeito quando prega. Tudo o que ele diz está totalmente certo, mas ele não vive o que prega, convivo com ele!
Cristianismo autêntico não é sofisticado, é simples. Não é papo furado, é fato apurado no modo de viver de cada um de nós. A reputação é o que os outros pensam que nós somos; o caráter é o que Deus sabe que eu sou no escuro, quando ninguém me vê.
Se Deus sabe quem sou e mesmo assim Ele me busca com o seu amor eterno, por que quero parecer o que não sou? Mendigos, nada é mais absurdo do que um amado por Deus querer ser amado, por seus méritos.
o espírito da cruz 11 – adorando o adorador
Alguém disse: Quando o “eu” não é negado, ele é necessariamente adorado. O ponto crucial da vida cristã é a morte do ego. Não é possível o eu adorar e ser adorado ao mesmo tempo. Para que eu possa adorar a Deus, o meu ego tem que ser crucificado.
É preciso que nós morramos em Cristo, a fim de podermos adorar a Cristo. No altar não há lugar para Deus e o homem simultaneamente. Se Deus estiver sendo de fato adorado, o ser humano será um mero adorador e nunca um espetáculo de adoração. Não existe a possibilidade de um adorador merecer as honras como tal.
O adorador desiste de si e insiste em ver apenas o Adorado, por fé. Não existe um adorador chamando a atenção para a sua adoração. Quem adora, adora a quem é o Digno de adoração, sem qualquer prosopopéia ou holofotes para sua visibilidade.
Diante do trono de Deus não há shows. O altar do Senhor não é um palco para que os artistas se exibam com os seus talentos prodigiosos, mas um patamar, no nível do chão, a fim de que os adoradores se prostrarem com a face voltada à sua origem do pó.
Hoje, o culto a Deus foi transformado no culto aos homens. Há uma cultura de exaltação que cultua quem se diz cultuar. O cantor virou o centro da louvação; o pregador, o centro da pregação; o adorador, o centro da adoração. Com isso tudo, o culto cristão se tornou num teatro barato com atores se exibindo e espectadores se deleitando.
Todavia, como bem ensina Jim Elliot: aqueles que conhecem o grande e terno coração de Jeová, certamente serão levados a negar seus próprios amores, para poder participar da expressão do Seu amor! Não é coerente para o coração que adora receber o reconhecimento da adoração que presta. É lamentável ver os adoradores homenageados.
Estive numa reunião em que o culto estava voltado aos homens. Participei de um culto onde os homens estavam voltados a Deus. Na primeira, havia a cultura de show. No segundo havia uma atitude de devoção. Uma era um espetáculo. O outro, adoração.
O ser humano não foi feito para questionar, mas para adorar. Não foi feito para se exibir num palco, mas para se prostrar diante da face amorosa do Pai. Na casa de Aba não há lugar para uma folia na presença do Altíssimo, mas para a real prostração. Fomos chamados para estar diante do Senhor e jamais perante uma platéia.
O espírito da cruz esvazia a necessidade do entretenimento e nos estremece com a necessidade do entendimento sobre a presença da Trindade, no culto. A adoração não faz parte da vida cristã, ela é a própria vida cristã diante do Amor Soberano de Deus.
Mendiguinhos, não somos atores no show que tem fim, somos adoradores num culto eterno. Não exibimos os talentos na congregação, congregamos à moda do detetive, presente no cena, mas sem ser visto. É isto, adorar!
o espírito da cruz 10 – cristão orgulhoso ou ímpio humilde?
Alguém disse: A obra-prima do diabo é levar-nos a ter um bom conceito de nós mesmos, nem que esse conceito seja para demonstrar um espírito de inferioridade, a fim de promover a humildade por debaixo dos panos molambentos. Mas, é só aparência…
A humildade não é um estilo de vida; é um estado do ser que nunca se vê num espelho, refletido. O humilde não se enxerga como humilde, porque, para isso, teria que ver-se em total dependência da soberana e absoluta suficiência de Deus.
O humilde não é um ser a desestimar-se; não é um capacho, mas alguém que depende inteiramente do poder e da vontade do Altíssimo em sua vida, sem, com isso, se estimar. Não é um narcisista contemplando a sua imagem refletida no poço dos despojos.
A humildade não se deprecia, para chamar a atenção, nem valoriza a sua cota para ganhar pontos aos olhos dos espectadores. Ser um cristão orgulhoso é contradição tão grande como ser um ímpio humilde. Se vendemos a nossa imagem por um preço além ou aquém do que somos, devemos suspeitar de nossa experiência de salvação.
C. P. Cockerton diz: o orgulho, no sentido religioso, é a atitude de autonomia, de autodeterminação, de independência de Deus. A humildade não é rebaixamento, mas é teonomia completa, isto é, dependência plena do governo Divino. A essência do pecado é a arrogância, a essência da salvação é a submissão ao Altíssimo em dependência.
Aquele que for submisso ao Senhor será também submisso aos que o Senhor colocar em posição de liderança. Não há lugar para a insubmissão na vida dos servos do Cordeiro. O que caracteriza um discípulo de Jesus é a disposição íntima de ser obediente à sua lei, e a lei de Cristo se resume em fazer tudo por amor ao Pai.
O espírito da cruz mostra que é melhor ser um verme humilde do que um anjo soberbo. No reino da graça é melhor se acocorar e lavar os pés dos arrogantes do que se agarrar aos direitos de manipular as circunstâncias com a omissão do serviço.
A Bíblia diz que Deus resiste ao soberbo, porém assiste ao humilde. Talvez, o que esteja por trás, seja: Deus precisa quebrantar o soberbo, levando-o ao fracasso, até que o fracassado se perceba incapaz e renuncie qualquer possibilidade de se auto dirigir.
Só o submisso ou dependente pode ser instrumento da graça neste mundo de topetudo, tropeçando em tronos e estrebuchando em sua entranhas, em razão de sua obesidade de inveja, ciúme e ambições do poder, como o Rei Momo em trajes de faquir.
Mendigo, altivo, é aberração. Mas se for um, alcançado pela graça, ouça o que William Law diz: Se o homem precisa gloriar-se de qualquer coisa como sua, deve fazê-lo em relação à sua miséria e ao seu pecado, pois nada mais do que isto é propriedade dele – Ok! No amor do Amado, do velho mendigo do vale estreito, GP.
Justiça Própria!
ISAÍAS SESSENTA E QUATRO : SEIS
“Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia; e todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniquidades como um vento nos arrebatam.”
o espírito da cruz 9 – calar ou falar
Vou insistir nesta migalha com o que disse Matthew Henry: “Um leão na causa de Deus precisa ser um cordeiro em sua própria causa.” Se faço apologia feroz no que diz respeito ao Reino de Deus, sou um advogado, sem causa, no que me diz respeito.
Acredito que o espírito da cruz não signifique paspalhice ou covardia, quando a defesa são os princípios eternos do Evangelho. Mesmo assim, não precisamos ser do tipo agressivo ou mesmo guerrilheiro, mas, também, nada de passividade aqui. Mansidão fala do desapego dos bens pessoais, nunca, porém, do descaso como o Reino de Cristo.
O mártir é como um cordeiro em sua defesa, mas como um leão firme em seu testemunho da mensagem do Evangelho. Falando de si é dócil, embora ruja ao pregar a mensagem inegociável de Cristo. Não se importa consigo, mas importa-se com sua fé.
Alguém disse que um cristão não se defende, nem reivindica seus direitos, mas não se cala quando tem que anunciar a Cristo e os seus propósitos. Ele nada tem para se justificar, já que foi justificado, por Cristo, contudo, nada justifica o seu silêncio diante das injustiças neste mundo destoante dos princípios do Evangelho.
O espírito da cruz não é a fragilidade ou a timidez diante da perseguição cruel no mundo, do mesmo modo, que não é uma guerrilha por causa dos valores ligados aos interesses pessoais. Quem já foi crucificado com Cristo não tem o que requerer para si, muito menos, o medo da morte. “O que faz um mártir não é o sangue, mas a causa“.
Calar, quando se devia falar pode ser tão prejudicial, quanto falar, quando se devia calar. O espírito da cruz nos mantém adequados nas duas posturas. O silêncio, no momento oportuno, é tão contundente como o discurso que não pode ser calado. Tudo vai depender da condução e da motivação determinada pelo trono da graça.
Foi o ilustre poeta inglês cego, John Milton, quem viu com clareza: “Os mártires abalaram os poderes das trevas com a força irresistível da fraqueza“. Porque viveu a sua vida sem a luz do sol, podia entender o que são as trevas. Quando vivemos na fraqueza é que podemos ver o poder de Deus capaz de abalar as estruturas das ogivas nucleares.
Gosto de pensar que a “fé é o meio pelo qual as fraquezas do homem tomam posse da força de Deus”. Se eu nada posso, mas, pela graça, me aproprio do pleno poder do Altíssimo, então, me torno onipotente dentro de Sua vontade. Ninguém e nem qualquer coisa pode fazer coisa alguma, fora da permissão divina, na vida dos que confiam n’Ele.
Senhores Mendigos, quem pode destruir uma vida que foi alcançada pelo amor do Abba? Citei, recentemente, em um velório, o que alguém disse: “A morte não passa de um incidente físico em uma carreira imortal.” Se nós ganhamos a revelação do alto de que temos a vida eterna, quem nos matará?
o espírito da cruz 8 – obediência?
Eric Alexander disse: “A evidência do conhecimento de Deus é a obediência a Ele.” Mas jamais uma obediência movida a medo, vergonha, culpa, interesse ou dever. A obediência, com esses traços e essa cara, ou é vassalagem ou negociata.
A obediência cristã nunca será uma escravidão a um legalismo dominador, mas a submissão voluntária à vontade divina, sob o estímulo do amor. Para tanto é necessário que a minha vontade seja conquistada pela vontade de Deus. Se a minha vontade não for vencida pela vontade divina, não haverá qualquer significado na minha
A cruz de Cristo precisa crucificar o desejo da minha vontade soberba obediência, a ponto do meu querer egoísta poder querer sobretudo o querer de Deus. Quando eu quiser tudo o que for da vontade de Deus, então a minha vontade se contentará com a vontade d’Ele, de tal maneira, que a minha alegria será fazer de boa vontade a Sua vontade.
Obedecer de má vontade é tirania. Obedecer voluntariamente é um milagre da graça que me faz querer de boa vontade fazer a vontade de Deus. “É só pela graça divina que o homem pode obedecer à lei de Deus,” com sua vontade disposta a obedecer.
Precisamos compreender o que bem disse R. B. Kuiper: “Antes de serem atos do homem, fé e obediência são dons de Deus.” E, eu acrescento a essa lista, também, o arrependimento. O homem natural não é dotado de fé, nem será capaz de arrepender-se por si mesmo e muito menos de obedecer a Deus, de quem ele se esconde e foge.
Alguém disse que a obediência é o lado positivo do arrependimento. E qual é o negativo? Virar as costas para o pecado. Outro disse que o arrependimento pode ser visto como a confirmação da fé autêntica, enquanto essa é uma dádiva da eleição graciosa. Eu gosto de pensar que os três: fé, arrependimento e obediência são dons eternos dados na eternidade pelo Pai aos Seus filhos e requeridos na história deles.
Na vida espiritual nós não temos nada, se do céu não nos for dado. Assim, a fé, o arrependimento e a obediência são dádivas na vida daqueles que foram convocados de modo decisivo pela graça irresistível do Pai, crucificados juntamente com Cristo e guiados pelo poder do Espírito Santo. Estes atributos não são naturais de Adão.
Dito isto, podemos afirmar, categoricamente, que a rebeldia e insubmissão são contrárias ao espírito da cruz. As ovelhas de Cristo estão marcadas com cravos nas suas orelhas e nas patas: o que ouvem, obedecem. Aquelas que obedecem voluntária, livre e sinceramente dedicam-se para obedecer totalmente, vivendo em comunidade.
Mendigos! Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, admoestemo-nos; o Dia se aproxima (Hb 10:25). Obediência não é a essência, mas é uma evidência do relacionamento correto com Deus.
o espírito da cruz 7 – orgulhoso de ser humilde
Ser um crucificado com Cristo é viver sob os efeitos do espírito da cruz. Pois é: isto quer dizer que, não basta confessar com os lábios, é preciso levar nos lombos a cruz como estilo de vida. O espírito da cruz encarna a condição de um crucificado.
Não estou falando de uma perfeição na conduta, mas da perfeita condução na vida espiritual dos sinais dos cravos. Há muitos de nós que falam um discurso adequado, embora desdigam tudo com o modo de viver. A boca fala certo e a vida desmancha tudo.
Quero, porém, reiterar: não estou me referindo a uma vida sem jaça ou sem um defeito ou problema, mas a uma vida sem jactância, com a altivez, no madeiro.
O espírito da cruz, antes de promover em nós, uma vida santa, promove a vida quebrantada, pois santidade sem quebrantamento é pura arrogância. Nada pode ser mais falso do que um santo empinado ou emproado. Santificação sem quebrantamento é uma contradição de termos, tanto como dizer que um pecador é humilde de espírito.
Muitas pessoas pensam que estão quebrantadas, quando estão apenas sob o manto roto da aparência, fingindo pobreza ou baixa estima para chamar a atenção do seu modo de viver, mantido para impressionar a turma da arquibancada. Nós precisamos mais do que traços de humildade, precisamos de um quebrantamento no pó e na cinza.
O Deus de cócoras, como o escravo de terceira categoria, é o modelo autêntico deste tipo de humilhação que expressa quebrantamento. E aqui, não basta demonstrar ter uma mente humilde, é preciso ser um ente quebrantado. O espírito da cruz tem que agir no íntimo e levar o sujeito a sujeitar-se a ser humilhado com desprendimento e festa.
Jesus disse com total precisão: qualquer, pois, que a si mesmo se exaltar, será humilhado; e qualquer que a si mesmo se humilhar, será exaltado. Mateus 23.12. Agora, a questão: como posso me humilhar sem sentir-me orgulhoso de ser humilde? Este é o xis do problema: o quebrantamento genuíno, que o espírito da cruz deve promover.
Um pregador eloquente e estudioso subiu ao púlpito como um pavão, cheio de si, sabendo que havia se preparado convenientemente, todavia, o seu sermão foi trágico. De cabeça baixa, sem disfarçar a humilhação, passou próximo de um velho crente que o ajudou com essas palavras: “se você subisse como desceu, teria descido como subiu”.
Não quero apenas, em minha vida, o discurso da cruz, eu quero a encarnação do seu curso. A grande mensagem do Evangelho é o Verbo encarnado que foi ao Calvário para me salvar de mim mesmo e a sua perfeita atualização é a minha crucificação diária levando o morrer de Jesus em meu modo de viver.
Mendigos, não fomos chamados ao pódio a fim de sermos condecorados, mas ao porão para limpar os pés dos falidos como nós.
o espírito da cruz 6 – no cemitério não há sindicato
O conceito de ressurreição com Cristo é mais facilmente aceito pela maioria da gente que transita pela igreja, do que o tema anterior da nossa co-crucificação com Ele. É mais agradável admitir o ganho de uma nova vida do que a perda da nossa antiga.
O ser humano não gosta de pensar no fim de si mesmo. Sair do controle é um baque para o velho Adão. É preferível admitir uma soma que permita o convívio do velho com o novo do que subtrair Adão para manter só Cristo. Mas, não há a menor alternativa, pois a vida cristã não se trata de uma composição, e sim, de uma substituição.
Contudo, para compreendermos isto, é necessário percebermos que nossa co-morte é algo feito para nós e nunca algo que fazemos em nosso favor. Cremos que tudo foi feito por Cristo, cabendo a nós receber seus benefícios como um dom da graça.
Os filhos de Deus creem que o seu velho homem foi crucificado com Cristo, por isso, levam em seu viver diário o morrer de Jesus como expressão de sua fé numa obra já consumada, gerando paz com Deus; enquanto os legalistas se mortificam para, de algum modo, apaziguarem a Deus por seus esforços e terem, assim, de que se gloriar.
O espírito da cruz nos mantém em estado de dependência plena na suficiência de Cristo, tanto no sentido de nossa redenção como de nosso progresso. Tudo, na fé em Cristo, é totalmente pela graça e nada que não seja de graça tem valor no Reino de Deus. Contudo, não confunda a graça plena de Cristo com a indolência de gente indisposta.
Achar que podemos fazer alguma coisa na vida cristã sem a total dependência da graça é desconhecer o espírito da cruz. Cuidado Mendiguinhos: “O orgulho, no sentido religioso, é a atitude de autonomia, de autodeterminação e de independência de Deus.”
Assim, só uma pessoa fraca, na vida cristã, pode ser de fato forte. É a astenia plena ou a fraqueza total mediante a morte com Cristo, que promove a dependência real na suficiência de Jesus Cristo ressuscitado. Não há cristianismo autêntico sem a morte do velho Adão que nos comandava. É preciso tirar o tirano para Cristo viver em nós.
O verdadeiro arrependimento começa na humilhação do coração e termina na transformação da vida. Por outro lado, uma vida transformada é uma vivência humilde em perfeita humilhação diante de Deus e dos homens. O cristão que foi transformado dos pés à cabeça, não somente se humilha, como também não faz caso de ser humilhado.
Um cadáver vestido ou desnudo não se envergonha. Mortos não se defendem de qualquer tipo de injúria. Nos cemitérios não há sindicatos. Se já morremos com Cristo, por que ainda nos defendemos quando somos acusados ou vilipendiados? Meus amados mendigos, nós carecemos de um exame necrológico. Morremos ou é apenas um ataque cataléptico? Onde está o atestado de óbito?
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o espírito da cruz 5 – turbulência a bordo
Hoje estou enfrentando uma forte tentação. Toda tentação é humana e ataca especialmente os filhos de Deus. A vida de Jesus antes de ser anunciada a sua filiação de modo claro como o Filho de Deus é pouco conhecida. Nada se sabe de sua luta pessoal e de suas tentações. Mas, logo que o Pai proclamou: este é o meu Filho Amado em quem tenho todo o meu prazer, o inferno investiu contra Ele com uma fúria atroz.
Jesus não venceu o Diabo com sua força pessoal, mas com a fé sustentada pelo Pai mediante a Palavra inspirada pelo Espírito Santo. Ele viveu aqui num estado de total dependência do Pai. Jesus, o homem histórico, não se valeu de Sua natureza Divina para sustentar os conflitos de Sua natureza terrena. Viveu aqui no espírito da cruz.
Cristo, a segunda pessoa da Trindade, esvaziou-se de Sua glória ao tornar-se o Jesus histórico. Cristo era 100% Deus, embora vivesse por aqui 100% como homem. Jesus não foi um homem garantido pela natureza Divina, mesmo que Cristo nunca tenha se ausentado de sua história. Era a vida de um homem que confiava em Deus.
O homem de Nazaré viveu totalmente pela fé, por isso, Ele foi denominado de o Autor e o Consumador da fé. Ele viveu o tempo todo como homem sob o espírito da cruz, isto é, renunciando a Sua vontade humana e dependendo completamente do Pai.
O princípio da cruz é um modo de ser de auto-esvaziamento e, ao mesmo tempo, de total dependência do alto. Jesus renunciava Sua vontade humana enquanto se nutria da vontade de Seu Abba. Negava-se a si mesmo para gozar da aceitação do Pai.
Alguém disse: “os tesouros no céu são armazenados somente na proporção em que são renunciados os tesouros na terra.” Negar-nos a nós mesmos, por todo tempo de nossa existência, não é nada comparado com a aprovação da Trindade, de eternidade a eternidade. Ser aceito com um amor incondicional nos habilita a renunciar aquilo que é apenas circunstancial e provisório. O espírito da cruz desconsidera o perecível.
Quem foi aceito pelo Deus eterno pode dispensar muito bem a aprovação de meros mortais. O espírito da cruz leva em consideração os tesouros eternos. Foi assim com Moisés, no Egito, que vendo as riquezas eternas toma suas decisões, preferindo ser maltratado junto com o povo de Deus a usufruir prazeres transitórios do pecado.
Minhas tentações são profundas e reais. Sou fraco e incapaz de vencê-las, todavia tenho como apólice Alguém que me segura. Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado. Mendiguinhos, se forem feitos do mesmo barro que eu, não se aflijam durante a turbulência do voo, pois o Piloto, além de ser o melhor Capitão é a Aeronave.
o espírito da cruz 4 – palco ou porão?
É importante a ortodoxia. A teologia torta é responsável pela deformação de um bando de gente que se diz cristã, mas é uma turma falsificada. Sem a boa forja teológica não se forma um caráter cristão autêntico. A doutrina correta é fundamental para a fé.
Todavia, não basta alguém ser ortodoxo, é preciso ser crucificado. Ter uma boa mensagem na ponta da língua é maravilhoso, embora muitos preguem em cima da risca da verdade, todavia, ainda podem se perder eternamente. Jesus disse que há muita gente pregando certo e fazendo muitas coisas em Seu nome, mas Ele não conhece esse povo.
Imprescindível é a mensagem ortodoxa, mas precisamos mais ainda do espírito da cruz, isto é, de alguém que morreu com Cristo e vive apenas pela vida de Cristo.
Volto a chover no molhado: é preciso ter uma mensagem certa, sim; mas, ainda assim, nunca reivindicar os direitos humanos pra si mesmo. O espírito da cruz jamais virá em busca dos holofotes, mas da iluminação do Altíssimo. Não procurará um palco para se exibir, mas um porão para se ocultar das massas, enquanto se prostra diante da Trindade.
O crucificado pode ser usado pelo Soberano, todavia nunca usará a soberania do Senhor para levar vantagens pessoais. Aquele que carrega em si os sinais dos cravos não vai se postar como um usurpador da glória que pertence apenas ao Cordeiro.
O espírito da cruz destrona o ego da alma que pretende se valorizar e, valoriza a adoração ao Cordeiro que se humilhou para nos alcançar. Não há lugar para uma alma gorda na sala do banquete. Ninguém que se valoriza pode adorar. Austin Phelps dizia em sua meditação: “na mais elevada devoção, perdemos a consciência de nós mesmos.”
O mundo vive de exibição, o cristão do esvaziamento de si mesmo. No mundo adora-se em altar e pódio e pode-se exaltar os ídolos. No cristianismo, o espírito da cruz rechaça qualquer idolatria, fazendo morrer o ego e os seus divertimentos. Nós até temos a possibilidade, por exemplo, de apreciar o futebol, desde que fora de nossos corações.
Todo ser que respira louva ao Senhor, mas só os filho de Deus podem adorar o Redentor. O louvor é o reconhecimento da criatura diante da grandeza do Criador, porém, a adoração é o reconhecimento dos filhos do Altíssimo acerca da maravilha do Seu amor. E, neste caso, não há adoração misturada com a idolatria. Deus e ídolos se repelem.
Como esportista, foi triste ver a Alemanha dá aquele chocolate no Brasil. Mas, como brasileiro e cristão, tive que reconhecer a importância dessa surra. O futebol é um ídolo que precisa ser destronado, especialmente daqueles que se declaram filhos de Aba.
Meus caros mendigos, o espírito da cruz exclui de sua agenda qualquer tipo de idolatria que lhe toma o tempo e as afeições. Como diz o apóstolo: Filhinhos, guardai-vos dos ídolos. 1 João 5:21.
o espírito da cruz 3 – pobre, sozinho e morto.
“O cristianismo tem um segredo desconhecido pelos comunistas ou capitalistas… como morrer para o eu. Este segredo torna-nos invencíveis,” propõe W. E. Sangster.
Quem pode vencer um morto? O espírito da cruz anula o poder da cobrança. Não é possível matar quem já morreu. Há na história uma história de um cristão nobre de Roma que foi levado à presença do imperador da época, para que negasse a sua fé em Cristo.
O César, arrogante, o constrange:
-se você não negar a sua fé, eu mando confiscar todos os seus bens. Você ficará pobre e miserável. Não terá mais nada…
– Nada? Eu não possuo coisa alguma neste mundo. Como ficarei sem nada? Eu não entendo esse tipo de argumentação. Sou apenas um mordomo.
O imperador, irado, disse:
– Então, eu o mando para uma ilha deserta.
– Como assim? Em qualquer lugar que estiver, estarei na presença de Deus. Nunca estarei solitário. Não existe solidão para quem vive em intimidade com Deus.
Irritado, bravo e fora de si, o imperador se destempera e vai à loucura:
– Eu o mato; eu o mando à arena para ser comido pelos leões.
– Morte? O que é isso? Como se pode matar quem já morreu com Cristo?
Quem pode vencer um morto? O espírito da cruz anula o poder da cobrança. Não é possível matar quem já morreu. Há na história uma história de um cristão nobre de Roma que foi levado à presença do imperador da época, para que negasse a sua fé em Cristo.
O César, arrogante, o constrange:
-se você não negar a sua fé, eu mando confiscar todos os seus bens. Você ficará pobre e miserável. Não terá mais nada…
– Nada? Eu não possuo coisa alguma neste mundo. Como ficarei sem nada? Eu não entendo esse tipo de argumentação. Sou apenas um mordomo.
O imperador, irado, disse:
– Então, eu o mando para uma ilha deserta.
– Como assim? Em qualquer lugar que estiver, estarei na presença de Deus. Nunca estarei solitário. Não existe solidão para quem vive em intimidade com Deus.
Irritado, bravo e fora de si, o imperador se destempera e vai à loucura:
– Eu o mato; eu o mando à arena para ser comido pelos leões.
– Morte? O que é isso? Como se pode matar quem já morreu com Cristo?
Esse é o segredo da invencibilidade. Quem pode roubar àquele que não é dono de coisa alguma? Quem pode desterrar e manter em um lugar isolado quem vive alegre na companhia da Trindade? E quem pode matar quem já foi crucificado com Cristo?
J. Blanchard disse: “Morrer para nosso conforto, nossas ambições e nossos planos faz parte da própria essência do cristianismo”. Isso é o espírito da cruz. Não se trata de uma doutrina, apenas, mas, de um estilo de vida: a mortificação da natureza terrena por aquele que teve o seu velho homem assassinado juntamente com Cristo.
O filho de Deus mortifica-se porque o seu velho homem já foi crucificado com Cristo; ele faz morrer a sua natureza terrena. O legalista tenta mortificar-se para poder apaziguar a sua consciência diante de Deus, a fim de ter de que se gloriar.
Dou valor esse pensamento de C. H. Spurgeon, quando falava aos seus alunos no seminário: “Preparem-se, meus jovens amigos, para se tornarem cada vez mais fracos; preparem-se para mergulhar a níveis cada vez mais baixos de auto-estima; preparem-se para a auto-aniquilação – e orem para que Deus apresse este processo”.
Não basta termos uma pregação correta sobre a obra da cruz, é preciso que nós tenhamos, bem definido, o espírito da cruz agindo em nós. Mendiguinhos, olhe o que diz Josif Ton a esse respeito: “Quando você coloca a sua vida no altar, quando se prontifica e aceita morrer, você se torna invencível. Não tem mais nada a perder.” Aqui reside o fato concreto da invencibilidade
O Espírito da Cruz 1 – sem qualquer glamour
Não vivo preocupado com a pregação correta, ainda que isso seja essencial. O que me chama a atenção, antes de tudo, é o espírito da cruz esculpido no caráter do mensageiro que se diz crucificado. O pregador da cruz deve trazer os sinais da cruz.
Se o meu ego não estiver crucificado com Cristo, de algum modo, irei botar as mangas de fora, quer no palco, quer nos bastidores. Quando o eu não estiver de fato crucificado, buscarei, de alguma maneira a esgueirar-me por entre a multidão, a fim de ser reconhecido. Um eu bem disfarçado, como se estivesse mortinho, é bem mais perigoso do que qualquer ego arrogante do mercado. Do ponto de vista do perfeito discernimento espiritual, é preferível um ego vivinho da Silva, sem máscara, do que um, fingindo-se de morto, mas vivaldino, querendo levar vantagens na pista.
A simples doutrina da Co-morte com Cristo tem produzido um bando tagarela de papagaios de gaiola que declaram-se crucificados, porém vivem como se fossem carcarás que “pegam, matam e comem”. O discurso dessa gente é corretíssimo e legal, mas o curso da vida é torto e cheia de artimanhas. É preciso cautela.
A vida espiritual autêntica não busca a visibilidade pública, uma vez que vive diante do trono para publicar as virtudes dAquele que a chamou das trevas para a sua maravilhosa luz. Quem foi realmente crucificado com Cristo não se preocupa com a sua imagem perante a platéia, mas com a glória do Cordeiro imolado. Mathew Henry dizia que “a primeira lição da escola de Cristo é a abnegação”.
O espírito da cruz não se exibe, pois tem como missão anunciar Cristo crucificado,sem qualquer necessidade de ser visto, pessoalmente. É um espírito sem glamour.
Alguém já disse que negar coisas a si mesmo é bem diferente de negar-se a si mesmo diante de coisas que lhe fazem digno e das pessoas que podem dar-lhe boa dose de prestígio. Assim, nada é mais aviltante para o ego do que o seu anonimato.
O espírito da cruz tira o crucificado do palco e o põe no sepulcro. Como dizia G. B. Cheever “À medida que o homem morre para o eu, ele cresce em vida diante de Deus.” Quando o ego some, Cristo assume a vida dos filhos da ressurreição.
Uma irmã sussurrou-me: não confio naquele pregador. – Por que? – Tudo o que ele fala é certo, mas o seu estilo é político, além do que, esnobe. Ele tem a doutrina correta, mas uma ambição desmedida, no sotaque. Ainda que ele fale sobre a obra da cruz, a sua fala denuncia, no fundo, o seu desejo de pódio. O seu espírito é mais de trono do que de cruz. O comentário é pertinente e precisa de atenção especial.
Concordo com A. W. Tozer que “há uma doce teologia do coração que só se aprende na escola da renúncia.“
migalhas para mendigos 12 – prostrado em adoração por causa da fé
Não sei quem disse, mas é bem dito: “Qualquer pessoa pode contar as sementes de uma maçã, mas só Deus pode contar as maçãs que brotarão de uma semente.” A onisciência é dificílima de compreensão, mas um Deus que seja previsível deve ser desprezado.
Vocês, por acaso, já viram algo que se compare à graça generosa de Deus ou à sua mais profunda sabedoria? É algo acima da nossa compreensão, que jamais entenderemos. Há alguém que possa explicar Deus? Alguém inteligente o bastante para lhe dizer o que fazer? Alguém que tenha feito a ele um grande favor ou a quem Deus tenha pedido um conselho? Tudo dele procede; Tudo acontece por intermédio dele; Tudo termina nele. Glória para sempre! Louvor para sempre! Amém. Amém. Amém.Romanos 11:33-36 (Bíblia “A Mensagem”)
É constrangedor o fato de saber que Deus nunca pode ser surpreendido, mas, ao mesmo tempo, é um descanso para aqueles que creem na imutabilidade Divina. Saber que Deus é o mesmo de eternidade a eternidade e que não pode ser tratado como mero reformador de móveis usados é, igualmente, assustador e consolador.
Um pensamento que me tem ajudado nesses últimos anos é o de Gerald Coates, que diz: “Deus nunca esteve decepcionado com você, pois Ele jamais teve ilusões a seu respeito“. Se eu não estiver fora do alcance de Suas mãos protetoras é porque nunca estive fora do alcance de Seus olhos previdentes. Se Deus me tem alcançado na história é porque Ele já me havia projetado na eternidade. Minha história com Deus não é casual ou provisória.
O pecado não foi um acidente, nem a redenção é um remendo. Porém não foi Deus quem promoveu o pecado, nem a salvação foi vista depois da queda. Mas, preciso de atenção – há casca de banana na estrada: “Ou Deus é soberano e a eleição, uma expressão de sua vontade, ou o homem é soberano e a eleição é uma expressão da presciência de Deus.”
Vejo agora que eu não fui salvo porque Deus já sabia que eu iria crer, porque nesse caso, Sua soberania dependeria da minha fé. Na verdade, eu fui salvo porque Deus me deu fé para crer. Se eu vivia no pecado, vivia na antítese da fé. O pecador é um incrédulo e a fé é um dom de Deus. Nenhum incrédulo pode crer se antes não for convencido do pecado.
As Escrituras falam do mistério da fé. Não vi ainda a explicação plausível desse mistério. Sei que ela vem pelo ouvir da Palavra de Deus. Sei ainda que é um dom da graça. E sei também que Jesus é o Seu autor e executivo. Mas, por que a fé não é de todos?
Fico aqui com Benjamim B. Warfield: “A maravilha das maravilhas não é que Deus, em seu infinito amor, não tenha eleito toda esta raça culpada para a salvação, mas, sim, que ele elegeu alguns dos membros dela.” Isto é espantoso e ao mesmo tempo admirável.
Mendiguinhos, prostro-me maravilhado. Como pode Deus escolher-me a mim, o pior dos pecadores? Só adoração!
migalhas para mendigos 11 – o amor de Deus não é permissivo
Eu estive lendo algo de Donald Barnhouse, e ele disse: “O amor de Deus não é uma bondade natural permissiva como muitos imaginam e, por isso, o arrastam na lama; é rigidamente justiça e por esse motivo Cristo morreu.” Mas Cristo é justo e amoroso.
Por que quem Cristo morreu? Por gente de barro, quebrada, enlameada e suja. Morreu em favor de quem a Trindade elegeu na eternidade, mas caiu; por isso, teve que justificar na cruz e dar vida a essa gente morta em pecados, chamando, daí, eficazmente ao dom do arrependimento e da fé na suficiência do Cordeiro imolado na cruz.
A cruz é o trono em que a Divindade consegue conciliar o amor e a justiça, sem banalizar o primeiro, usando de tirania com a segunda. O amor e a justiça se congraçam tão bem no sacrifício do Cordeiro, que a Trindade é capaz de ser perfeitamente amorosa com o pior pecador, embora não seja indiferente ou condescendente com o pecado.
A Trindade amou o mundo antes que o mundo existisse. Ela continua amando a todos os Seus do mundo, mesmo depois que todos se tornaram imundos por causa da lama do pecado. A Trindade não perdeu o controle do mundo em razão do húmus sujo.
O Deus Triúno não deixará de amar os Seus imundos que estão neste mundo de poeira e lodo, atolados no pecado. Mas o amor de Deus não é uma permissão para que vivamos enlameados. Ser salvo e achar que é normal viver na lama, é um absurdo. O bebê pode sujar as suas fraldas, mas não pode viver com as suas fraldas sujas.
Porque Deus nos ama como pecadores, isto não significa que devemos viver chafurdados no lodaçal. O filho de nome “pródigo” pode ir até ao chiqueiro e tentar comer lavagem, todavia, teve chance de cima de cair em si e voltar-se para a casa do Pai.
A Trindade tem todo poder de libertar, amorosamente, o imundo, levando Cristo a morrer por ele, e, ao mesmo tempo, fazer com que esse imundo morra para o mundo, na mesma cruz com Ele, para, em seguida, fazê-lo viver em santidade. Aqui o amor toma o lugar do réu na cruz, mas a justiça exige que o réu seja incluído no mesmo sacrifício.
Se Cristo morreu pelo pecador, como propõe o amor gracioso da Trindade, e o pecador foi unido a Cristo, como determina a justiça Divina, então, não são sustentáveis as propostas que, em nome do amor de Deus, possamos viver comendo a lavagem deste mundo imundo naturalmente. Não é da natureza dos filhos de Abba essa dieta de porco.
Tornar o amor da Trindade o patrocínio de murmuração e imoralidade é sujeira própria daquele que não conhece nem o amor, nem a justiça. Mendiguinhos, precisamos crer que os nossos maiores pecados são minúsculos diante do infinito poder da justiça de Cristo, porém, nossa insignificância é maiúscula perante seu amor eterno e incondicional ao libertar-nos de toda sujeira.
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migalhas para mendigos 10 – a incompreensível soberania
Bem sei que tudo podes, e que nenhum dos teus planos pode ser frustrado. Jó 42:2.
Se Deus for soberano, Ele vai querer o que bem quiser. E se Ele for onipotente, tem poder para fazer tudo o que quiser. Assim, Deus tem o Seu poder de fazer coerente com a Sua soberania de querer, por isso, tudo o que Ele quiser, pode fazer perfeitamente.
Se Deus for soberano, Ele vai querer o que bem quiser. E se Ele for onipotente, tem poder para fazer tudo o que quiser. Assim, Deus tem o Seu poder de fazer coerente com a Sua soberania de querer, por isso, tudo o que Ele quiser, pode fazer perfeitamente.
Sabemos que Deus, sendo Deus, faz tudo o que quer e nada pode impedir os Seus propósitos. O profeta pergunta em nome do Senhor: agindo Eu quem impedirá? Se Deus quiser, Ele pode fazer. Neste caso, se o plano de Deus para a humanidade for levar todos à salvação, então Ele o fará, sem que ninguém impeça a Sua vontade.
Agora, o impasse: nem todos serão salvos. Então, é porque Deus não pode ou porque não é o Seu propósito salvar a todos? Esta é uma questão difícil de explicar desde que nosso objetivo seja missionário. Não conseguimos entender um Deus que não queira salvar a todos. É complicado pensar que Deus só salva se Ele quiser. Mas se pode fazer o que quiser e não salva quem se perdeu, é porque não era Seu plano salvar?
Ora, se Deus for soberano e onipotente, Ele pode fazer tudo o que quiser e, se todos não forem salvos, então podemos concluir que não é a Sua vontade salvar a todos?
Muitos se indignam com essa possibilidade, porque pensam que o objetivo de Deus é de beneficiar o ser humano de qualquer jeito. Estaria obrigado a salvar, custe o que custar?
Porém, se Deus for Deus, não está sujeito a ninguém. Ele salva quem quiser e quando quiser. Na verdade, os salvos foram salvos na eternidade. Isto pode até parecer injusto, porém, quando analisamos que Ele não tem a obrigação de salvar a ninguém e que todos estão condenados pelo pecado, não há a menor injustiça em salvar alguns; o que há, de fato, é graça plena, pois Ele só salva sob os fundamentos do demérito.
Precisamos lembrar que Deus é soberano, que tem todo poder e que ninguém O pode impedir de fazer o que quiser. Que tudo o que Ele faz está diretamente ligado com a Sua glória e nunca com os nossos interesses. Que tanto a salvação do pecador indigno, como a condenação do presunçoso tem, como pano de fundo, a Sua soberania e glória.
Todos os pecadores merecem ir para o inferno. É justa a condenação de todos, logo, se Deus salvar alguns, Ele não é injusto para com os condenados, embora seja mui gracioso para com os salvos. A questão, agora, é: por que, então, Ele não é gracioso para com todos? Seria Deus Soberano? Não? E agora?
Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim? Romanos 9:20. É impossível crermos na graça plena, sem a plena graça agindo em nós.
Mas, vamos lá. “Deus não pára para consultar-nos”. Ele faz tudo o que faz por ser quem é: Soberano, embora não seja déspota.
migalhas para mendigos 9 – o morto vivo
“Viver neste mundo é complicadíssimo. Todos os dias temos que tomar alguma decisão que tem consequência e implicações sérias para o nosso futuro. Quer saber meu ponto de vista? – Prefiro morrer”. Foi o que me disse um dia alguém ansioso e deprimido.
Concordei com o sujeito, mas tentei argumentar que deveria haver um tipo de morte em que a gente morre, embora continue vivo. Isto pareceu estranho. – Como morrer e ainda ficar vivo? Não faz sentido! Você está ficando louco?
Talvez. Tudo isso parece mesmo loucura. Contudo, vamos pensar: todos nós temos uma vida biológica, a vida do nosso corpo, mas ainda temos uma vida que se pode denominar de psicológica, a vida do nosso ego. São tipos de vidas bem distintas.
Li, de um bebê que escorregou das mãos de um médico embriagada que fazia o parto e teve um traumatismo craniano que o manteve em estado vegetativo por mais de 20 anos. Ele era até saudável, biologicamente, mas não tinha uma vivência psicológica. Era um morto vivo. Vivia fisicamente, porém estava morto na sua alma.
Os problemas da ansiedade, angústia, egoísmo, depressão e um tanto de outras manifestações não são propriamente de caráter biológico. Parece mesmo que a coisa toda tem um fundo psíquico. Eu acredito que o furo que faz vazar a nossa energia no cotidiano está na alma. O que você acha? Será que a vida da alma não deve morrer?
– Então, você está dizendo que eu deva perder a minha identidade?
Não é bem assim. Não é perder a sua personalidade. Mas perder a vida que dá vida ao seu ego. É perder o seu controle do vôo e deixar que o Piloto eterno assuma o plano até o pouso. Nossa ansiedade existencial é uma contradição da verdadeira confiança.
Mentes e corações inquietos tomarão decisões incertas e não conseguirão um descanso na graça. A vida psique jamais se descontrai; está sempre na tentativa de vir a comandar, e, deste modo, precisa morrer. Se a vida do ego não for substituída pela vida ressurrecta, a vida de Cristo, não haverá libertação em nossa existência aqui na terra.
A ansiedade é uma característica da vida psique e “ é o resultado natural de centralizarmos nossas esperanças em qualquer coisa menor do que Deus e sua vontade para nós.” Quem fica preocupado não tem tempo para descansar na providência do alto e acaba pecando contra o cuidado amoroso do Pai. O ansioso não consegue crer.
Para Jesus, aquele que perde a sua psique, na cruz com Ele, vai ser, de fato, preservado pela vida zoe, ou a vida da ressurreição. Mendigos, se vocês morreram com Cristo, para a vida ansiosa, certamente viverão aqui com a vida confiante na suficiência do Altíssimo. Já disseram: “o diabo nos quer ter sempre atravessando torrentes que não existem”. Então, só se for um morto vivo.
migalhas para mendigos 8 – buscados para buscar
Há alguns jogadores que ficam descontentes porque o técnico não os escolheu para fazer parte da seleção. Tem gente que fica zangada porque o técnico não convocou o atleta de sua preferência. Nos esportes há técnicos demais, cada vez que alguém tem uma opção diferente para um jogo e melindres em excesso, quando aquele que se acha bom, não é convocado. Parece que no reino de Deus a coisa é bem diferente, mas…
Creio que George S. Bishop foi na mosca tratando a respeito da seleção Divina: “A eleição corta pela raiz a salvação por mérito e obras”. Tenho procurado mostrar aqui, nas Migalhas, que não são os méritos nem as obras que dão suporte à escolha. A salvação de Deus é pela graça, portanto não tem negócio, troco nem troca de favores.
Ainda que eu não saiba como Deus em Seu amor eterno escolheu em Cristo os Seus, eu sei que Ele os escolheu pela graça, pois o apóstolo Paulo nos diz: E, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é graça. Romanos 11:6.
Donald MacLeod raciocinou: “A doutrina da eleição não… existe em um vácuo. Ela precisa ser vista no contexto da soberania divina, da depravação do homem e da entrega da fé”. Deus é absolutamente soberano; o homem encontra-se totalmente depravado por causa do pecado e destituído de vida espiritual, logo, só um milagre para que ele tenha fé.
Se Deus não for o soberano na escolha, o homem, ao decidir, pela sua salvação, será soberano, pois Deus irá depender sempre desta ação humana para poder conceder a salvação, e, neste caso, não foi Deus quem o chamou. Sendo assim, “como cristãos, devemos sempre nos lembrar de que o Senhor nos chamou para si mesmo, não por causa de nossas virtudes, mas a despeito de nossos defeitos.”
Gosto, não por ser irrefutável a comparação, mas, por ser improvável a escolha do animalzinho, apresentada por C. S. Lewis: “os agnósticos amáveis falarão alegremente de como o homem procura a Deus. Para mim, eles podem também falar sobre como um rato procura o gato… Deus encostou-me na parede.” E o pior, todos nascemos ateus.
Não vejo opção para um fugitivo e rebelde contumaz, senão o convencimento da Trindade. Como sou muito limitado, minha única alternativa foi concordar com a evidência bíblica que diz: ninguém busca a Deus, deste modo: “Só quando Deus nos procura é que podemos ser encontrados por ele. Deus é quem busca, não quem é procurado.”
Concordo que o Filho Amado e Eleito do Pai é Cristo e que a nossa eleição está projetada deste a eternidade nEle para os que creem. A questão é: quem são estes? Ora, se a fé não for de todos, como surgem os crentes? Mendigos, se vocês está buscando a Deus, saibam que foram buscado antes.
migalhas para mendigos 7 – a seleção de Deus e a escolha humana
Olá! Vou continuar nesse assunto que tem causado algumas contestações. Sei que é difícil de entender, porém, é bíblico e pertinente. Não podemos fugir dele só porque é árido. Não é o ser humano quem busca a Deus. Agostinho dizia: “Tu nos buscaste quando não te buscávamos; de fato, nos buscaste para que te buscássemos.”
Porém, como já foi dito por Joseph Alleine, um dos homens de Deus do século XVI, “Você está começando de modo errado se discutir primeiro acerca de sua eleição. Prove, de fato, a sua conversão e nunca mais duvide de sua eleição”.
O convite diz: O Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele que ouve, diga: Vem! Aquele que tem sede venha, e quem quiser receba de graça a água da vida. Apocalipse 22:17. O outdoor na frente da Casa de Abba diz: entre. Quando você entra, olha para trás e vê no portal, do lado dentro, escrito: eleito desde a fundação do mundo. Mas, só os escolhidos dão crédito ao chamado Divino e entram pela porta que é Cristo.
É fato, muitos são chamados, mas poucos, escolhidos. Mateus 22:14. A pregação é para toda criatura, a escolha da seleção é soberana. “O homem não se converte porque deseja, mas deseja converter-se porque a eleição assim dispôs”, continua Agostinho, e ele vai mais longe: “Deus escolheu-nos não porque cremos, mas para que creiamos”.
Ainda que o escolhido tenha que decidir por essa escolha Divina, a sua decisão não é uma determinação de sua natureza caída. “Deus não nos escolheu pela fé, mas para a fé”, porque o ser humano morto, em delitos e pecados, não tem fé, em si mesmo, e, se a tivesse, tal fé traria mérito para uma salvação que é totalmente pela graça.
Vejam como Arthur C. Custance esclarece isso, com precisão:
“Sempre que há um afastamento em qualquer medida da doutrina da eleição, há também um afastamento do evangelho, pois tal afastamento sempre acarreta a introdução de alguma obrigação da parte do homem em dar uma contribuição para sua própria salvação, contribuição essa que simplesmente ele não consegue prestar.”
Não há nada na raça adâmica que preste e nada que possa contribuir para a sua salvação, senão, os seus pecados.
Se você estiver buscando a Deus, ótimo, mas, saiba, de antemão, que essa busca não é sua. Há um Deus eterno buscando aos Seus, desde a eternidade. Você só poderá buscá-lo porque, antes da criação, você já foi eleito por Ele.
Confira A. W. Pink: “O Espírito Santo faz algo mais em cada um dos eleitos de Deus do que faz nos não-eleitos. Ele opera neles “tanto o querer como o realizar segundo a sua boa vontade”. A decisão dos escolhidos é uma realização ativa da graça plena agindo nos seus corações.
Mendiguinhos, “a salvação não é uma medida precária, mas um alicerce lançado nos céus.”
Do velho mendigo do vale estreito,
Glenio